Artigo publicado na edição do último Sábado do semanário Expresso, no suplemento de Economia, que transcrevo com a devida vénia:
O Governo não tem nenhum estudo que prove que a Ota é melhor que Rio Frio. O que possui (de 1999) diz o contrário
Nas últimas semanas, todos ouvimos, ditos e repetidos até à exaustão, uma infinidade de argumentos que mostram, a quem ainda tinha dúvidas, que a Ota é uma má localização para o novo Aeroporto de Lisboa. Um pouco timidamente, foram também ouvidas sugestões de localizações alternativas à Ota, com especial enfoque no Poceirão. Só que, basta olhar para os mapas que foram publicados na imprensa, para ver que Poceirão e Rio Frio são, no fundo, a mesma coisa. Nota-se, de facto, embaraço em falar de Rio Frio, pois alguns dizem que “já foi chumbado por razões ambientais”, em 1999. Ora, é preciso desfazer este embuste; não houve qualquer “chumbo ambiental” a Rio Frio. A decisão foi política. O que é interessante, é ser a ministra do Ambiente de então, vir dizer isso mesmo, agora, em várias entrevistas.
Vejamos os factos. Em 1998/99, foram realizados Estudos Preliminares de Impacte Ambiental para a Ota e o Rio Frio, na altura em que eram essas as duas localizações em disputa. De acordo com tais estudos, foram identificados impactes significativos nas duas localizações, mas nenhum desses impactes foi considerado impeditivo de um aeroporto. A Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental, nomeada para apreciar esses estudos, embora tivesse dado mais importância ao que era desfavorável em Rio Frio, como os sobreiros e os aquíferos, apresentou conclusão idêntica. O que aconteceu foi que, logo a seguir, em 5 de Julho de 1999, um Despacho conjunto dos Ministérios das Obras Públicas e do Ambiente, vetou Rio Frio, invocando “graves prejuízos ambientais”.
Sem dúvida curioso é o facto de esse despacho ter sido proferido um mês antes de o Governo receber o relatório do consultor a quem o próprio Governo tinha encomendado, um ano antes, um estudo para decidir a localização do aeroporto. É o famoso estudo do AdP (Airports de Paris), de Agosto de 1999, de que muitos falam, mas poucos leram, até porque foi “convenientemente” mantido reservado, até há muito pouco tempo. É de salientar que esse estudo foi adjudicado no âmbito de um concurso, para o qual foram convidados os grandes consultores internacionais nesta área.
Trata-se de um estudo multicritério, um trabalho notável, em que foram ponderados os factores económicos, sociais e ambientais das duas localizações: Ota e Rio Frio. Foram analisadas três opções: Ota, com as pistas orientadas na direcção N/S, e Rio Frio com duas possibilidades de orientação das pistas: N/S e E/W. Foram estudados 18 parâmetros. No que se refere ao ambiente, foi utilizada a informação dos Estudos Preliminares de Impacte Ambiental, atrás referidos. O resultado não deixa margem para dúvidas: 1º - Rio Frio E/W: 718 pontos; 2º - Rio Frio N/S: 675 pontos, e 3º - Ota: 616 pontos. Em rumo, o actual Governo não só não tem nenhum estudo que prove que a localização Ota é melhor que Rio Frio, como, o que possui (herdado de 1999), diz o contrário.
Considero, contudo, que a discussão não deve ser centrada apenas na localização do aeroporto, mas deve abranger o conjunto dos novos projectos: Novo Aeroporto, Rede de TGV e Nova Travessia do Tejo. A integração da realização destes projectos permite, por um lado, melhorar o desempenho de cada um deles e, por outro, reduzir o seu custo global.
Torna-se assim ainda mais fácil concluir que a melhor localização do Novo Aeroporto é na margem Leste do Tejo, na zona entre Rio Frio e Poceirão, ali ao lado da auto-estrada A12. Este é o local mais próximo de Lisboa com condições para satisfazer os requisitos de desempenho do aeroporto, tanto no imediato, como no futuro. Trata-se de uma zona plana, sem obstáculos à volta e de fácil acesso a todo o país, ficando a apenas 25 km de Lisboa pelas pontes Vasco da Gama e Chelas-Barreiro. Os custos de construção serão reduzidos e terá facilidade de expansão.
Um plano integrado com o aeroporto em Rio Frio-Poceirão, no entroncamento das linhas do TGV do Porto e de Madrid, a entrarem conjuntamente em Lisboa pela ponte Chelas-Barreiro, também com comboios convencionais e tráfego rodoviário, é extraordinariamente vantajoso, permitindo uma poupança superior a 3000 milhões de euros, ou seja, metade do custo das obras a realizar na zona de Lisboa.
O Governo não nega os problemas da Ota, mas diz que não pode parar o processo para estudar alternativas, por ser imperativo termos o Novo aeroporto a funcionar em 2017, altura em que se estima que o Aeroporto da Portela terá a sua capacidade esgotada. Ora, aqui está mais uma razão para construir o aeroporto em Rio Frio-Poceirão. Como se sabe, para construir um aeroporto na Ota, são precisas movimentações de terras e tratamentos de terrenos que demoram perto de três anos, ao passo que, numa localização na margem Leste do Tejo, os trabalhos equivalentes, porque são muito mais simples, não demoram mais de seis meses. É, portanto, ao contrário; um aeroporto em Rio Frio-Poceirão estará pronto mais de dois anos antes do que se for na Ota. Não há dúvida, depois de dissecados todos os argumentos, a única coisa que resta a favor da Ota é a obstinação do Governo.
S. Pompeu Santos, Engenheiro Civil, Vice-Preidente da Associação Internacional da Engenharia de Estruturas
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